2 de abril de 2011

História do comércio

Há alguns meses a revista Digesto Econômico me encomendou o seguinte artigo?

Passado e presente do comércio no mundo




Renato Pompeu





No passado remoto da humanidade, entre as diferentes populações prevalecia a barganha. Os produtos de uma população, por exemplo carne de gado, eram trocados pelos produtos de outra população, por exemplo panos. A procura de uma equivalência em cada troca era muito complicada, até que surgiu o dinheiro, em sua função de meio de troca. Por isso, antes do dinheiro, a par da barganha, existia a troca de presentes entre as aldeias.

O comércio propriamente dito adveio da troca de um produto por dinheiro e do uso desse dinheiro para comprar outro produto, sistema muito mais simples e muito mais eficiente do que a barganha ou a troca de presentes. Tornaram-se possíveis as caravanas a grande distância, no lombo de animais, tendo surgido daí o que já se podia chamar de comércio internacional, pois as caravanas iam do Extremo Oriente até a Europa Ocidental.

Na Antiguidade, na Grécia e em Roma, a maioria dos varejistas armava tendas a céu aberto, semelhantes às barracas de nossas feiras-livres. Em Roma surgiram prédios de comércio, na maioria para venda e consumo de bebidas quentes. Na Idade Média, por influência do próspero Oriente trazida pelas Cruzadas, foram surgindo lojas especializadas, o que levou à construção de ruas tortuosas, para proteger dos ventos os mostruários abertos que não eram protegidos por vitrinas por causa da dificuldade em obter vidro.

Lojas mais parecidas com as de hoje começaram a surgir no século 18. Desde o tempo em que todo o varejo era feito em barracas, até o século 19 e particularmente até os anos 1930 nos países mais adiantados, o modelo predominante era o do pequeno estabelecimento especializado em poucos produtos, como padarias, quitandas, armazéns, com funcionários que atendiam os fregueses e iam pegar a mercadoria solicitada em balcões ou prateleiras, ou guardadas a granel em barris e sacos. Os alimentos e os produtos em geral não eram embalados em tamanhos e pesos padronizados, de modo que cada freguês escolhia o quanto queria levar de cada alimento.

Quanto às lojas, as coisas começaram a mudar há duzentos anos. A primeira loja de departamentos surgiu em Paris, o Bon Marché, nos inícios do século 19. A Harrods, de Londres, começou a funcionar em 1849. Na passagem do século 19 para o século 20, a outra mudança: os alimentos em particular e outros produtos em geral passaram a ser embalados com tamanhos e pesos uniformizados, acelerando o processo de cada venda a cada freguês.

Depois da loja de departamentos, o outro avanço foi a ascensão das redes de lojas.

A história das redes de lojas, hoje tão presentes na paisagem urbana de tantos países, começa em 1859, nos Estados Unidos., quando a Great Atlantic & Pacific Tea Company abriu seu primeiro estabelecimento de venda de alimentos A&P; A primeira loja Woolworth de varejo em geral começou a funcionar em 1879 em Utica, em Nova York. O crescimento foi rápido: em 1929, as redes de lojas representavam 22 por cento do varejo nos EUA; nos anos 1920 surgiram as primeiras redes americanas de lojas de departamentos, como a Sears .

Os custos do negócio por loja, nas redes, eram menores do que nas lojas independentes, pelo preço menor das grandes encomendas aos fornecedores e pela redução do número de empregados com a adoção do chamado selfservice (introduzido inicialmente numa mercearia em 1916, em Memphis, no Tennessee)., além do que as lojas de redes eram sempre mais bem localizadas do que o pequeno comércio. Além disso, nas lojas independentes e nas lojas de departamentos eram muito mais frequentes, por causa do caráter mais pessoal do atendimento, os casos de discriminação racial ou social, com os donos e balconistas se recusando a servir fregueses negros ou mal vestidos. As redes de lojas eram ao mesmo tempo mais impessoais e mais democráticas.

Nos anos 1930, por pressão dos pequenos comerciantes, surgiram leis federais restritivas ao crescimento das redes, que porém não foi afetado e continuou acelerado, estimulado pelo governo, por causa da colaboração das redes com os programas sociais e com o esforço de guerra na Segunda Guerra Mundial. Uma ameaça maior às redes de lojas foram os supermercados, que surgiram nos anos 1930 (o primeiro foi no bairro de Queens, na cidade de Nova York) e de início eram cada um de um pequeno empresário ou formavam pequenas redes, mas eram muito mais espaçosos e tinham muito mais itens à venda do que qualquer loja de rede na mesma vizinhança. Os supermercados americanos dominaram o mercado de alimentos e de utensílios domésticos nos anos 1940 e 1950; na década de 1950 começaram a se espalhar pela Europa e em seguida pela América do Sul.

Desde os fins da Segunda Guerra Mundial tinham se generalizado nos EUA os shopping centers (o pioneiro abriu em Kansas City, em 1922), cuja principal característica, do ponto de vista de atrair a clientela, é a partilha de um imenso estacionamento por dezenas e dezenas de lojas, oficinas de serviços, restaurantes, lanchonetes, cinemas, teatros, etc. Nos anos 1950 as redes americanas de lojas passaram a montar redes de supermercados; paralelamente, o número de shopping centers no país chegava a 2 mil. Em contrapartida, nos anos 1990 ocorreu a consolidação da associação de pequenos varejistas nas chamadas redes voluntárias, das cooperativas de compras no atacado e da generalização das franquias. De modo que o modelo de redes se tornou o predominante no comércio varejista. De outro lado, grandes varejistas de descontos, como o Wal-Mart, passaram a pôr em xeque o predomínio dos supermercados.

Nos EUA, hoje, há 47 mil shopping centers. Mas um país em que o varejo talvez vá se tornar mais importante na economia do que nos Estados Unidos, é a Índia. Como tradição milenar, o varejo indiano é o maior ramo da economia, com 8 por cento do total de empregos e 10 por cento do total do PIB. Estima-se que em 2016 o varejo indiano vá valer mais de 175 bilhões de dólares, talvez até 200 bilhões de dólares. As lojas tradicionais estão cedendo espaços a supermercados, hipermercados e shopping centers – destes, dezenas e dezenas são inaugurados por ano. O setor preponderante é o de alimentos, que cresce a 9 por cento ao ano. Apesar do avanço da modernização, 60 por cento dos itens alimentares vendidos são de produtos sem marca, mas a participação de produtos de marca vem aumentando.

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