19 de janeiro de 2014

Alunos reais e alunos ideais

Trabalho de Psicologia da Educação - Renato Pompeu - Entrevista com professora de Matemática do ensino médio em escola pública, que se recusou a falar pessoalmente e preferiu responder por escrito: 1) Em sua opinião, quais aspectos psicológicos afetam a aprendizagem dos seus alunos? Resposta: Carências afetivas Relações interfamiliares Insegurança Falta de objetivo de vida, crença no próprio futuro, ou seja, falta de perspectiva. 2) Como professor, quais são as condutas relevantes para manter o aluno motivado à aprendizagem? Resposta: Além de atividades dos conteúdos, procuro uma aproximação com o aluno quando percebo a falta de motivação e utilizo uma linguagem não severa para chamar atenção, sempre estou informando aos meus alunos das possibilidades que eles têm para investir em seu futuro. 3) Você percebe alguma relação entre a motivação e o autoconceito do aluno? Explique com exemplos da sua sala de aula. Resposta: Sim, quando em classe a grande maioria é desinteressada os poucos alunos que têm algum interesse e objetivos têm certa dificuldade em manter-se fiéis às suas metas. 4) Como professor, você tem procurado melhorar o autoconceito do aluno? De que modo? Resposta: Sim; Em diálogos constantes e procurando estar disponível para conversar sobre qualquer assunto. 5) Você acredita que as habilidades sociais podem interferir no comportamento dos alunos na escola? De que maneira? Resposta: Sim; Sendo a escola um espaço de convivência heterogêneo naturalmente o adolescente em fase de formação está vulnerável a mudanças de condutas sociais e consequentemente sofre com interferências na condução de seus objetivos ou fins que persegue. 6) Em sua opinião, o que é indisciplina? Resposta: Quando o indivíduo tem dificuldades em aceitar restrições ou leis que convêm ao funcionamento de uma organização e consequente desenvolve ações de desordem e desobediência e distorções de autoestima. 7) Quais são os problemas de indisciplina observados na sua sala de aula? Como você os aborda? Resposta: Procuro desenvolver as atividades propostas no tempo determinado, dar atenção à aprendizagem e à necessidade de responsabilidade com o aprender; chamando atenção para a importância do fazer para aprender. 8) Como você aborda o erro na sala de aula? Resposta: ? DISSERTAÇÃO Introdução Pelas respostas dadas, a professora não parece ter um mínimo de conhecimento teórico ou experiência em psicologia educacional que lhe permita lidar com as dificuldades psicológicas de seus alunos, ou pelo menos da grande maioria deles. Isso apesar de ela estar consciente de que os problemas psicológicos interferem no aprendizado. Desenvolvimento A professora não parece estar consciente das diferenças entre autoestima, autoavaliação e autoconceito. Também não consegue fazer uma análise psicológica adequada dos problemas de seus alunos, mesmo porque ela, em geral, os concebe como um grande público, um conjunto de pessoas, e não como indivíduos. Ou seja, ela não nota que, em questões psicológicas, cada pessoa é única e irrepetível; cada caso é um caso e deve ser estudado e cuidado sempre individualmente. As respostas dela parecem indicar que ela encara cada classe em que dá aula do mesmo jeito, composta de uma massa anônima e indiferenciada. No máximo, ela os divide entre os desinteressados em aprender, que formam a grande maioria, e os poucos que querem aumentar seus conhecimentos. Ela só dá alguma atenção pessoal a esses poucos que querem aumentar seus conhecimentos e, mesmo assim, apenas quando perdem claramente a motivação, influenciados pelo desinteresse da grande maioria. Ela parece não estar consciente de o que seja o conceito de “habilidades sociais”. Também ficou surpresa, ou mesmo perplexa, e imobilizada quando perguntada sobre como lida com o erro, a ponto de ter respondido a pergunta sobre o assunto com um simples ponto de interrogação. Isso parece indicar que ela acha que cada erro de cada aluno seu deve ser simplesmente contabilizado para efeito de nota. Para ela, assim, o erro não deve ser discutido com o aluno, nem avaliado como tentativa frustrada de acertar. Ela não parece perceber que o erro tanto é produto de uma dificuldade do aluno em aprender como também é produto de uma dificuldade dela em ensinar. Conclusão As indicações são de que a professora dá aulas para um público ideal que só existe em sua cabeça e não para cada público concreto com que se está confrontando, muito menos para cada indivíduo concreto que tem como aluno. Ela parece se concentrar nos poucos alunos que correspondem a seu público ideal, sem estudar e observar profundamente todos e cada um de seus alunos. Não demonstra assim ter maior formação em psicologia da educação.

Um comentário:

Non je ne regrette rien: Ediney Santana disse...

Perguntas inteligentes, respostas inteligentes. E a conclusão foi perfeita, a ideia entre alunos reais e não reais, que eu diria que funciona quase com uma "seleção natural" pedagógica. Professores escolhem esse alunos ideias, o sistema permite e até incentiva essa seleção e o resultado todos nos ja sabemos: educação ruim