13 de fevereiro de 2010

EUA experimentaram no Brasil dos anos 1890 o que estão fazendo agora no Iraque

A seguinte resenha me foi encomendada há tempo pela revista Carta Capital:

Lente de aumento sobre Brasil e EUA nos anos 1890

Teses ousadas: a política americana atual, de expansionismo comercial apoiada por um militarismo sustentado por empresários particulares, e de imposição do regime democrático a países estrangeiros, política exercida por exemplo agora no Iraque e no Afeganistão, teve antecedentes há mais de um século, ocorridos nos relacionamentos com o Brasil. Treze anos após o original americano, a Companhia das Letras está lançando “Comércio e canhoneiras – Brasil e Estados Unidos na Era dos Impérios (1889-97)”, do historiador Steven C. Topik, da Universidade do Texas – onde há um grande centro de estudos sobre o Brasil -, famoso por seus trabalhos sobre o barão do Rio Branco. Trata-se a rigor de uma monografia sobre o tratado de comércio entre os dois países que vigorou entre 1891 e 1894, com isenções recíprocas de tarifas que beneficiavam principalmente os produtos agrícolas brasileiros no mercado americano e os produtos industriais americanos no mercado brasileiro. Trata também da Esquadra Flint, um grupo de navios de guerra organizado por um empresário americano para ajudar o governo do presidente brasileiro, marechal Floriano Peixoto, a combater a revolta da Marinha nacional, comandada pelos almirantes Custódio de Melo e Saldanha da Gama. A grande novidade do livro é que a Esquadra Flint teve papel muito mais relevante na história do Brasil do que os historiadores brasileiros vinham admitindo: teve peso fundamental na decisão do governo militar do País de convocar eleições que puseram no poder o primeiro presidente civil da República, Prudente de Morais – igualzinho, em linhas gerais, ao que vem acontecendo no Iraque e no Afeganistão. São 500 páginas de documentação exaustiva de apenas oito anos de história, mas os resultados vão muito além desse curto período de tempo. Como se usasse um microscópio para examinar a trama dos tecidos sociais, políticos e econômicos não só dos dois países e suas relações naquele tempo, Topik tira conclusões que se referem a um universo muito mais amplo, o da globalização, e a um período de tempo muito mais longo, até os próprios dias atuais. Ele também nuança com muita sutileza a tese de que “o Estado é o comitê dirigente das classes dominantes”, mostrando como as classes dominantes americanas, e mesmo o governo americano como um todo, se estavam então preocupando muito mais com o mercado interno e com a rebeldia dos trabalhadores do que em conquistar mercados externos, sendo essa conquista muito mais concretizada por individualidades no governo e no empresariado que tinham uma visão diferente.

Nenhum comentário: