12 de julho de 2013

América Latina: equívocos antigos da esquerda

Trabalho meu de História: UNIDADE 4 – A ESQUERDA E A REVOLUÇÃO SOCIALISTA NAS AMÉRICAS (1950–1970) Atividade Para além da Revolução Cubana e do Socialismo de Allende, faça uma pesquisa que reúna três dos principais movimentos, grupos políticos, pensadores e acontecimentos de esquerda em nosso continente. Verifique suas influências e propostas. Em seguida, verifique qual foi a relação dos EUA com tais movimentos. Não se esqueça de exercer o seu olhar crítico sobre os acontecimentos, buscando relacioná-los com seu contexto e especificidades histórica e regional. Apresente o resultado de sua pesquisa no Portfólio. Vamos tratar de três movimentos: o Sendero Luminoso do Peru, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia-Farc e a Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional-FMLN, de El Salvador. Quanto ao Sendero Luminoso, o pesquisador Lewis Taylor, em TAYLOR (s/d), anota que as origens remotas do movimento datam de 1965, quando eclodiram três movimentos guerrilheiros nas regiões andinas do Sul do Peru, inspirados pelo foquismo guevarista, difundido pelo intelectual francês Régis Debray, no livro “Revolução na Revolução”. Essas guerrilhas foram derrotadas em apenas seis meses, pelo governo peruano de então, sob o presidente Belaúnde Terry, segundo Taylor em parte por seus integrantes serem pessoas intelectualizadas das regiões litorâneas do país, sem maior conhecimento das necessidades específicas e da cultura das populações serranas. De todo modo, tendo tido sua atenção chamada por essas guerrilhas, o governo militar que se seguiu promoveu de 1969 a 1976 “uma profunda reforma agrária” nas regiões serranas do Sul do Peru. Desde 1980, durante o segundo governo Belaúnde, novas guerrilhas, mais bem organizadas, surgiram nessas regiões, comandadas pelo Partido Comunista do Peru-Sendero Luminoso. Taylor nota que, durante o governo militar nacionalista do general Velasco Alvarado (1968-1975), a esquerda radical, embora fosse perseguida pelas forças de segurança, pôde crescer por causa do clima de anti-imperialismo e de reformismo agrário fomentado então pelas Forças Armadas. Os militantes esquerdistas radicais aderiram à campanha governamental pela reforma agrária e a radicalizaram, comandando maciças ocupações de terra por milhares de camponeses durante todos os anos 1970, sob a direção da Confederação Camponesa do Peru, que agrupava camponeses e sem-terra. A consequência disso tudo é que, em 1975, a esquerda radical peruana era muito mais numerosa, muito mais ligada às massas e muito mais experiente politicamente, além de bem mais requintada intelectualmente, do que em 1965. Quando o governo militar nacionalista e reformista foi derrubado em 1975 por Morales Bermúdez, se desencadeou a mais grave crise econômica do Peru no século 20, à qual o novo governo reagiu com um programa de austeridade promovido pelo Fundo Monetário Internacional-FMI. Entre outubro de 1975 e agosto de 1978 o salário real caiu 35 por cento e, entre 1974 e 1977, o desemprego urbano subiu de 6.6 por cento para 9,4 por cento. De dezembro de 1974 a fevereiro de 1978, os preços subiram 221 por cento. De 1977 a 1979, a cada ano se realizou com êxito uma greve geral dos setores industriais, greves que foram se tornando cada vez mais politizadas. Durante esse período, as cidades comandaram as mobilizações; os efeitos imediatos da reforma agrária pelo governo militar, na qual o novo governo conservador não mexeu, trouxeram benefícios para os camponeses, que, apesar de se terem manifestado contra o novo governo, não estavam particularmente empenhados em apresentar reivindicações. Nas cidades, a Apra perdia terreno para a esquerda e para a esquerda radical. O líder trotskista Hugo Blanco se tornou um nome nacional, e as diferentes correntes da esquerda radical julgavam que o Peru vivia uma “situação pré-revolucionária”, com essas esquerdas esperando e preparando insurreições urbanas. A grande exceção era o Sendero Luminoso, que desde então se preparava para a guerrilha rural. O Sendero Luminoso existia desde 1970, quando surgiu de uma cisão, já comandada por Abimael Guzmán, da ala maoísta do Partido Comunista do Peru, a Bandeira Vermelha. Mas, dez anos depois, o Sendero se reforçou notavelmente, com a adesão a ele de militantes não só de cisões do Partido Comunista, como também do Movimento de Esquerda Revolucionária e da Vanguarda Revolucionária. Em 1970, Guzmán, professor de Filosofia na Universidade de Huamanga, na cidade andina de Ayacucho, era o pensador mais influente da Frente Estudantil Revolucionária pelo Caminho Luminoso de Mariátegui, de onde seu grupo recém-fundado tirou o nome, numa homenagem ao pensador heterodoxo que havia fundido o marxismo europeu com o indigenismo latino-americano. Em 1977, o Sendero (Caminho, em castelhano), havia se consolidado como um partido de quadros em escala nacional, particularmente no meio estudantil. Eram bastante dogmáticos e agressivos em seu maoísmo, chamados de “loucos” pelas outras facções esquerdistas, a cujos membros reagiam com insultos ainda mais pesados. No auge das movimentações durante o governo nacionalista e reformista, visto como “fascista” pelo Sendero, fascismo contra o qual só era viável a luta armada, o Sendero não teve maior atuação naquelas mobilizações, limitando-se a funcionar como uma escola de quadros inimiga das outras facções de esquerda. Em 1977, depois de o Sendero ter crescido no meio estudantil, principalmente no Sul do Peru e em Lima, uma luta interna levou ao abandono do foco na formação de quadros, em que insistia a liderança senderista em Lima, para a política de deslocamento dos estudantes para o campo, linha defendida pelos senderistas do interior, com Guzmán à frente. Em 1980, depois de ter atraído muitos militantes de várias outras correntes, o Sendero deu início a ações armadas, tendo surgido duas correntes, a de Guzmán, vitoriosa, que pregava a guerrilha rural até o cerco final das cidades, “linha maoísta”, e a oposição, que pregava a combinação de ações no campo e nas cidades, afinal derrotada. A partir de 1981, o Sendero chegou a contar com 200 células entre cinco e dez membros cada, em várias regiões do país, cada uma chefiada por um “comandante”, muitos deles treinados na China e na Coreia do Norte. Cada célula também tinha dois especialistas em explosivos, um educador político, e um educador físico treinador de combate sem armas. Todos tinham treinamento em primeiros-socorros e pelo menos um de cada célula tinha além disso alguma formação como paramédico. Além disso, médicos e enfermeiras colaboravam com o grupo. Uma vasta rede de simpatizantes proporcionava ajuda em logística e em informações. Cada célula se empenhava em ações de guerrilha rural e contra forças policiais ou militares. O esquema de organização se inspirava no do Partido Comunista da China durante a guerra civil. Os poucos documentos teóricos distribuídos fora do grupo demonstram uma análise da situação peruana semelhante à análise que Mao fez da situação chinesa durante a guerra civil. Segundo um dos raros documentos, o governo peruano representava “a burguesia burocrática, que chefia o campo contrarrevolucionário, lidera os senhores feudais e a burguesa compradora e é ligada ao imperialismo ianque”. Essa análise era profundamente incorreta: retratava mais o Peru dos anos 1920, tal como foi visto por Mariátegui, do que o Peru urbanizado e pós-reforma agrária dos anos 1980. Nela se reconhecem as características não do Peru como um todo, e sim da província andina de Ayacucho, região agrária que desde os tempos coloniais vinha sendo pouco produtiva, com grande número de camponeses muito pobres acreditando que o Peru era uma “grande Ayacucho”. Ao maoísmo se misturava um milenarismo nostálgico dos tempos incas. O pesquisador peruano Carlos Iván Degregori, em DEGREGORI (1996), anota que, quando começou suas ações armadas, o Sendero, em 1980, era composto basicamente de professores primários, secundários e universitários, e de estudantes. Em menos de um ano, porém, conseguiu crescer entre os camponeses e os sem-terra de algumas das regiões mais pobres dos Andes peruanos, nas quais conseguiu praticamente aniquilar a capacidade de agir de forças policiais. Nas cidades, no entanto, o Sendero não procurou arregimentar os trabalhadores, limitando-se a uma presença agitativa no meio estudantil e a atentados contra as redes de energia, que várias vezes deixaram Lima horas e até dias no escuro. O auge do Sendero foi em 1982, quando dominou vastas áreas de Ayacucho, onde instalou formas coletivistas de produção agrícola. Naquele mesmo ano, entretanto, as Forças Armadas intervieram maciçamente na província. Fiéis à estratégia maoísta de “recuar quando o inimigo avança”, os senderistas abandonaram sucessivas áreas ao controle do governo inimigo, sem levar em conta um dado fundamental da realidade: as populações locais costumavam se aliar a quem lhes desse proteção, no que o Sendero foi substituído pelas Forças Armadas. Os senderistas passaram a combater os próprios camponeses que, abandonados por eles, se tinham aproximado dos militares. Em abril de 1983, por exemplo, o Sendero massacrou mais de 80 camponeses na localidade de Lucanamarca. As ações do Sendero foram gradativamente se reduzindo em escala e em território, até que finalmente Guzmán foi preso em 1992 e condenado à prisão perpétua. Desde então o Sendero só tem realizado ações esporádicas, embora suas proclamações continuem tão grandiloquentes e tão fora da realidade quanto antes. Os Estados Unidos, grande alvo do Sendero, além de terem ajudado as forças governamentais com dinheiro, equipamentos, treinamento e assessoria, também, segundo várias fontes, financiaram um grupo de paramilitares, os Sinchis, que combateram os senderistas. E ainda ofereceram milhões de dólares de recompensa pela captura de líderes senderistas, em cada caso pelo menos dez vezes mais do que a recompensa prometida pelo próprio governo peruano. Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia-Farc Segundo artigo da pesquisadora Maria Alejandra Vélez, em http://redalyc.uaemex.mx/redalyc/pdf/1691/169118209004.pdf as guerrilhas colombianas, entre as quais se destacam as Farc, que já duram há décadas, começaram como guerrilhas exclusivamente rurais, mas, a partir do início dos anos 1980, passaram também a ocupar zonas urbanas e mesmo cidades. Esse processo acompanhou uma mudança geral da atitude dos guerrilheiros, podendo ser dito que passaram de “revolucionários guevaristas” a “soldados profissionais”. Ou seja, na fase anterior, os guerrilheiros lutavam para derrubar o governo, na nova fase tentaram estabelecer a guerrilha como meio de vida. Assim adotaram táticas e estratégias que Guevara não aprovaria, como incursões pelo narcotráfico e requisições sem pagamento de bens e serviços proporcionados pela população. As áreas urbanas que passaram a pretender ocupar e que de fato ocuparam não foram escolhidas por critérios políticos e militares, mas por critérios econômicos. Escolhiam-se as vilas e cidades em regiões de exploração de ouro, petróleo, carvão, coca e amapola, onde seriam mais rentáveis as requisições. Segundo a pesquisadora Vélez, a probabilidade de um município colombiano ser alvo das Farc aumentava em 154,7 por cento se ficasse em região de produção de coca e de amapola, em 292,9 por cento se ficasse em área de exploração de petróleo, e em 120,3 por cento se nele ocorresse garimpo de ouro. A única lembrança da opção inicial das Farc de defender as populações oprimidas e exploradas residia em que, se o município fosse mais pobre do que a média nacional, a probabilidade de ser alvo das Farc aumenta em 240,15 por cento. Diz ela: “Isso está de acordo com a hipótese de Echandía (1999), o qual afirma que a guerrilha se situa em municípios economicamente estratégicos em que, em cada caso, o próprio dinamismo econômico causou conflitos sociais e profundos desequilíbrios na distribuição da riqueza. Os municípios beneficiados por riquezas como as da coca ou do petróleo, recebem grandes migrações de gente em busca de novas oportunidades, quando com toda certeza não têm a infraestrutura necessária para recebê-los e satisfazer suas necessidades; isso gera inconformismo, devido à exclusão de processos que os beneficiem. Essa situação é aproveitada pelas Farc, para buscar apoio na população inconformada”. Os Estados Unidos combateram as Farc por meio de ajuda às Forças Armadas do governo colombiano e às forças paramilitares clandestinas do país, muitas vezes ligadas a narcotraficantes. Periodicamente também os EUA pedem a extradição de membros da Farc presos e acusados de narcotráfico, por supostamente estarem envolvidos com o crime organizado em território americano. A Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional, de El Salvador, foi analisada pela pesquisadora americana Cynthia McClintock, em McCLINTOCK (1998). A história das guerrilhas em El Salvador começa em 1932, quando começa e termina um movimento armado de camponeses índios liderados pelo militante comunista Farabundo Martí, no oeste do país; na chamada “Matanza”, as Forças Armadas exterminaram o movimento, com milhares de mortos. Martí foi condenado e enforcado. Em 1969, houve a chamada “guerra do futebol” entre El Salvador e Honduras, na verdade um conflito provocado por mau tratamento dos migrantes salvadorenhos em território hondurenho. No ano seguinte, uma cisão do Partido Comunista Salvadorenho, pró-soviético, redundou na fundação da Frente Popular de Libertação, que calculou que as condições estavam maduras para a revolução e se inspirava na guerrilha rural do Vietnã. Em 1972, uma cisão dessa FPL, o Exército de Libertação Popular, preferiu a guerrilha urbana e a insurreição nas cidades, com inspiração nos Tupamaros do Uruguai e nos Montoneros da Argentina. Em 1976, a discussão interna nesse ELP levou a sua direção militarista a até assassinar dissidentes que propunham a combinação da ação política com a luta armada – a maioria dos dissidentes acabou saindo e fundando a Resistência Nacional. Na mesma época, estudantes universitários radicais fundaram em El Salvador o Partido dos Trabalhadores Centro-Americanos, com o objetivo de promover a revolução em toda a América Central. Todos esses grupos praticaram atos terroristas em pequena escala durante todos os anos 1970, entre eles sequestros, assassínios políticos e assaltos a bancos. A essas mesmas ações se dedicou no final da década um outro grupo, as Forças Armadas de Libertação, formadas pelo Partido Comunista, que havia recém-abandonado a linha soviética de luta política pacífica e aderido à revolução armada. Em julho de 1979, na vizinha Nicarágua, a Frente Sandinista de Libertação Nacional derrubou o ditador Anastasio Somoza e tomou o poder. Mirando-se nesse exemplo, os vários grupos salvadorenhos resolveram, a contragosto, unir-se na Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional. O governo cubano, que havia fornecido armas para os sandinistas, quis estender essa ação para outros países latino-americanos e o governo sandinista se ofereceu para treinar guerrilheiros salvadorenhos e outros, mas tanto Cuba como a Nicarágua impuseram como condição que os grupos salvadorenhos se unissem, o que, mesmo com má vontade, acabou acontecendo. A FMLN, sigla adotada pela nova frente, tinha um diretório de cinco membros, um de cada organização participante, baseado na Nicarágua. Nos anos 1980, cubanos e nicaraguenses instruíram os salvadorenhos para que preparassem um exército regular para se contrapor, numa insurreição, às Forças Armadas de El Salvador. Para não aguçar a Guerra Fria, não foram usados armamentos dos países socialistas, mas armamentos ocidentais fornecidos pelo governo vietnamita. A insurreição, em janeiro de 1981, fracassou, com grande perda de vidas dos dois lados, e a guerra continuou intermitente nos anos seguintes, transformando-se naquilo que os estrategistas chamam de “guerra protraída”, isto é, lenta, retardada. A FMLN mobilizou 12 mil soldados, mas em meados da década de 1980 só tinham sobrado 6 mil integrantes. Considera-se que a guerra civil em El Salvador foi a última batalha da Guerra Fria, pois enquanto os rebeldes eram ajudados por Cuba e Vietnã e, indiretamente, pela União Soviética, até seu fim em 1991, as Forças Armadas eram equipadas, treinadas e assessoradas pelo governo americano. Paralelamente, a Frente promovia ações políticas nas cidades e a partir de 1985 as manifestações urbanas se intensificaram. Em 1992 houve um acordo político entre as Forças Armadas e a FMLN, que se integrou como partido político na nova estrutura democrática. Bibliografia DEGREGORI, Carlos Iván, “COSECHANDO TEMPESTADES - Las rondas campesinas y la derrota de Sendero Luminoso en Ayacucho”, IEP Ediciones, Lima, 1996, 2.a edição, em http://iep.facipub.org/textos/DDT/laderrotadesendero.pdf#page=186, acessado em abril e maio de 2012. McCLINTOCK, Cynthia, “Revolutionary movements in Latin America: El Salvador's FMLN & Peru's Shining Path”, United States Institute of Peace Press, Washington, 1998. TAYLOR, Lewis, “Maoism in the Andes: Sendero Luminoso and the contemporary guerrilla movement in Peru”, Codaprint, Liverpool, s/d, em http://www.liv.ac.uk/media/livacuk/rilas/publications/paper2.pdf, acessado em abril e maio de 2012. VÉLEZ, María Alejandra, “Farc-ELN: evolución y expansión territorial”, revista “Desarrollo y Sociedad”, março de 2001, cidade do México, emVÉÇEZ, http://redalyc.uaemex.mx/redalyc/pdf/1691/169118209004.pdf, acessado em abril e maio de 2012.

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