18 de novembro de 2013

Para ler na praia

Do Diário do Comércio de São Paulo - Livros para ler no parque e na praia - Renato Pompeu - Nesta primeira coluna do ano, o editor Marino Maradei Jr. me encarregou de listar livros adequados para ler no parque e na praia, em nossas férias de verão. Procurei escolher obras que sejam ao mesmo tempo clássicas e fáceis de ler. Minha primeira seleção é o livro de contos “Papéis avulsos”, do grande Machado de Assis, editado recentemente pela Martin Claret. È um livro de 1882, ou seja, de mais de 130 anos atrás, mas permanece rigorosamente atual. Recomendo especialmente a leitura de “O alienista”, novela incluída neste livro de contos. Trata-se da história de um médico numa pequena cidade fluminense, que um belo dia decide confinar todos os doentes mentais (na época, chamados de “alienados”) da cidade. Pouco a pouco a busca dos doentes mentais se torna cada vez mais abrangente, até abarcar praticamente todos os seres humanos acessíveis ao médico. O desenlace é surpreendente, e o livro, além de ser um entretenimento agradável e divertido, também mostra que Machado estava muito adiante de seu tempo na descrição das complexidades das doenças mentais. Outro conto absolutamente imperdível de “Papéis avulsos” é “Teoria do medalhão”. Na noite em que o filho chega à maioridade, na época os 21 anos, o pai lhe dá conselhos sobre como se consagrar na sociedade, por meio de falsos brilhos: trocar favores para obter vantagens, mostrar-se medíocre para não ferir melindres de pessoas socialmente superiores que podem se sentir inferiorizadas se tiverem de deparar com pessoas superiores em cultura e em inteligência. Em suma, as virtudes da ascensão social são as virtudes do medalhão, mais exatamente a mediocridade condecorada. Mais um livro agradável de ler sem maiores compromissos, mas que é um clássico da literatura brasileira, particularmente da literatura paulistana, é “Madame Pommery”, único romance, lançado em 1919, do engenheiro civil José Maria de Toledo Malta, que usou o pseudônimo de Hilário Tácito. É a história de uma prostituta judia (ou seja, uma “polaca”, na linguagem da época) na passagem do século 19 para o século 20 na já pujante cidade de São Paulo. O livro é cheio de truques. Seu título ecoa o célebre “Madame Bovary”, do francês Gustave Flaubert, enquanto Tácito foi um historiador romano antigo, de modo que “Hilário Tácito” se pode interpretar como “Historiador engraçado”. O livro é realmente uma graça. Se pode encontrar em edição da Ática. Saindo dos nacionais, também é agradável de ler e provoca aquele estado de graça de leitura absorta, tão típica do verão ao ar livre, o clássico romance “A montanha mágica”, do alemão Thomas Mann, publicado em 1924, havendo uma edição recente da Nova Fronteira. É a saga de pessoas de próspera condição social, afetadas por doenças pulmonares, que vão se tratar numa clínica no alto de uma nevada montanha suíça. Sem terem de trabalhar e sem maiores responsabilidades na vida, os pacientes, num ambiente requintado e elegante, passam o tempo discutindo altas questões da condição humana e vivenciando relacionamentos idealizados pela falta da necessidade de garantir a sobrevivência. Homens e mulheres vivem nesse mundo mágico, imunes aos conflitos da vida mundana. De 1946 é o livro “A ponte sobre o Drina”, do escritor iugoslavo Ivo Andric, Nobel de 1961, de ascendência sérvia e croata, de modo que é reconhecido tanto na Sérvia quanto na Croácia, uma das não muito comuns unanimidades entre os dois povos. Andric era um diplomata que, por se opor ao fascismo, ficou confinado em casa durante a Segunda Guerra Mundial, situação em que escreveu esse romance épico. Há uma edição recente pela Cavalo de Ferro, de Portugal. Obra-prima, o livro é cheio dos truques: todas as ações se passam sobre uma grande e belíssima ponte antiga no rio Drina, na cidade de Visegrad, perto de Sarajevo. São 500 anos de histórias, muitas delas verdadeiras, que aconteceram na ponte desde a sua construção até que ela foi bombardeada na Primeira Guerra Mundial. Pela Editora Record e pelo Círculo do Livro, há várias edições do romance da escritora italiana Elsa Morante, “A história”, editado em 1974. Trata-se de um grande painel da Itália durante a Segunda Guerra Mundial e nos anos posteriores, tal como foi percebida por uma modesta mulher das camadas mais carentes da sociedade italiana. Vê-se como a vida das pessoas mais humildes se insere nos embates mais grandiosos da história mundial. Belo como o seu título mais conhecido é o livro “Nuvens de pássaros brancos”, do japonês Yasunari Kawabata, Nobel de 1968, editado pela Nova Fronteira; e, com o título de “Mil tsurus”, pela Estação Liberdade, e ainda com o título de “Chá e amor”, pela Vega, de Portugal. O livro começa com a descrição detalhada de uma cerimônia do chá em que um jovem se depara com duas amantes de seu pai. É de leitura absorvente.

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