24 de agosto de 2013

Que pensam da Revolução de 1917 os russos atuais?

Ca180ideias Ideias de Botequim A Revolução de Outubro, segundo a intelectualidade russa atual Renato Pompeu Como este começo de ano tem ocorrido uma verdadeira entressafra de livros realmente importantes, vamos aproveitar o vácuo para falar de um tema particularmente interessante para as pessoas progressistas, às quais se dirige a revista Caros Amigos: como é que a Revolução Russa é vista atualmente na Rússia pós-comunista? À falta de pesquisas mais sérias sobre o assunto, e de uma vivência concreta na realidade russa contemporânea, podemos fazer uma boa ideia sobre o que pensa atualmente sobre a Revolução Russa a intelectualidade russa a partir da Nova Enciclopédia Russa, substituta da antiga Grande Enciclopédia Soviética. O primeiro volume (a edição inteira ainda não foi publicada) saiu em 2006, lançado em Moscou pela Izdaltel’stvo Entsiklopedia e pela Izdatel’skii Dom Infra-M, e é todo dedicado à Rússia. A apresentação é feita oficialmente pela Academia Russa de Ciências, sucessora da Academia Soviética de Ciências. A volumosa seção de História começa entre os séculos 4.o e 8.o, quando os eslavos passaram a ocupar o Leste, o Sudeste e o Centro da Europa. Mas, ao contrário da Grande Enciclopédia Soviética, que examinava as condições socioeconômicas à luz de uma interpretação bastante peculiar do marxismo, a Nova Enciclopédia Russa, se centra, na história da Rússia antiga, até os séculos 17 e 18, na constituição do Estado russo unificado e na constituição do Império Russo, por meio da descrição da ação de grandes personalidades e de intrigas dinásticas. Apenas a partir dos séculos 17 e 18 é que começam a surgir conceituações mais específicas a respeito das estruturas sociais e das atividades econômicas. O item “A Revolução de Outubro” de 1917 começa com uma declaração de Trotski, algo impensável na Grande Enciclopédia Soviética, a 7 de outubro pelo antigo calendário juliano, então em vigor na Rússia (uns treze dias atrasado em relação ao atual calendário gregoriano, que é o nosso calendário desde o século 16, de modo que se trata do nosso 20 de outubro de 1917). Se descreve em seguida como Kamenev e Zinoviev defenderam, ainda a 18 de outubro (31 de outubro nosso), que a revolução socialista na Rússia não era possível antes que ocorresse na Europa Ocidental. Na tarde e noite de 24 de outubro e na manhã de 25 (6 e 7 de novembro, para nós), quando se dá a tomada do Palácio de Inverno e do poder, se fala da ação de Trotski e Lenin, sem menção a Stalin. Em seguida se fala da ação de Kamenev na prisão de ministros do governo provisório e de Lenin na instalação do Conselho dos Comissários do Povo, nome dado aos ministros do governo revolucionário. Depois, já a 29 de outubro (11 de novembro), se fala de Kamenev, Rikov, Miliutin e Nogin, novamente sem menção a Stalin. Novamente Trotski é mencionado em janeiro de 1918, sobre o abandono da guerra pelo novo governo. No relato da Guerra Civil, novamente são mencionados Trotski e Kamenev como dirigentes importantes, além de Antonov-Ovseenko, mas Stalin não aparece em nenhum momento, o que parece indicar que os historiadores russos contemporâneos acham que ele não teve papel de destaque nem na Revolução, nem na Guerra Civil, que se encerrou só em 1922, com os bolcheviques tendo o poder central já havia cinco anos. Deve ser observado que Lenin, bem mencionado na Revolução, não aparece na parte da Guerra Civil, possivelmente por não ter exercido comandos militares diretos. Na verdade, segundo a Nova Enciclopédia Russa, Stalin, que não é mencionado nem no item da Revolução de Outubro, nem no item da Guerra Civil, só passou a ter importância bem depois da Revolução, pois ele só aparece no item Do Fim de 1922 a Julho de 1941, imediatamente em seguida à morte de Lenin, em janeiro de 1924, já como rival de Trotski pela sucessão do dirigente falecido. Note-se, no entanto, que nesse trecho se menciona que Stalin era secretário-geral do Partido bolchevique desde abril de 1922. O ano de 1922, igualmente de acordo com a Nova Enciclopédia Russa, marca o começo da repressão contra os opositores políticos do poder central, primeiro contra membros de outros partidos. Em seguida, se relatam as divergências entre os próprios bolcheviques, primeiro entre Stalin, de um lado, apoiado por Kamenev e Zinoviev, e, de outro lado, Trotski; depois, os próprios Kamenev e Zinoviev aparecem como opositores do já consolidado Stalin. Em outro artigo, vamos discutir como a Nova Enciclopédia Russa descreve a história soviética sob o poder de Stalin, desde sua ascensão até a invasão do país pela Alemanha Nazista. O importante, até aqui, é observar a maior relevância dada a Trotski nos primeiros anos da Revolução, enquanto durante grande parte da história da União Soviética Stalin era apresentado como o segundo em importância já desde 1917, após Lenin. Quem terá razão?

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