20 de setembro de 2013

Falhas na memória da esquerda

Ca190ideias - A diferença entre o que aconteceu e o que a esquerda lembra que aconteceu - Renato Pompeu - Uma coisa é o que aconteceu, outra coisa é o que a esquerda lembra que aconteceu. É o que parecem querer dizer os textos do “Dossiê verdade e memória na história da esquerda”, no número 8 da “Perseu, História, Memória e Política”, revista do Centro Sérgio Buarque de Holanda da Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT. São trabalhos sobre a Unidade Popular, a coalizão que sustentou a presidência de Salvador Allende no Chile até sua derrocada em setembro de 1973, por Carolina Amaral de Aguiar; sobre a atuação política do escritor Jorge Amado, em especial durante o regime militar, por Carolina Fernandes Calixto; sobre o importante romance “Em câmara lenta”, de Renato Tapajós, apreendido nos anos 1970 por relatar cenas de tortura e morte de presos políticos, de Eloisa Aragão, e sobre o papel de Edgar Rodrigues em relação ao anarquismo durante a ditadura militar, de Fabrício Pinto Monteiro. Há ainda, na revista “Perseu”, uma série de documentos originais surgidos durante a campanha das eleições presidenciais de 1989 e um caderno de fotos; artigos de Daniela Oliveira Ramos dos Passos, sobre a atuação da classe operária na Belo Horizonte recém-fundada; de Flávio da Silva Mendes, sobre os direitos sociais na Venezuela desde fins dos anos 1950 até fins dos anos 1990; de Dainis Karepovs, sobre personalidades de esquerda durante a ditadura; de Álvaro Bianchi, sobre a história recente dos trotskismos no Brasil. Finalmente, há uma resenha de Beatriz Ana Loner, sobre o livro “Tudo pelo trabalho livre! Trabalhadores e conflitos no pós-abolição (Bahia 1892-1909)”, de Robério S. Souza. Uma obra seminal: quase exatamente meio século depois de ter sido lançado em 1966, acabou de ser reeditado o clássico “Da senzala à colônia”, da historiadora ainda atuante Emília Viotti da Costa, em quinta edição, pela Editora da Unesp. Segundo a apresentação da historiadora Zilda Márcia Grícoli Iokoi, o livro revolucionou de tal modo a visão corrente sobre os problemas relacionados com a escravidão que nunca mais foi possível manter as visões anteriores. Em particular, a obra faz um balanço bastante crítico do papel pretensamente modernizador nas relações de trabalho que a cafeicultura teria tido em São Paulo e igualmente a obra foi pioneira ao restabelecer a verdadeira história da resistência encarniçada dos escravizados, tidos até então largamente como submissos. Note-se que o “colônia” do título não se refere ao Brasil Colônia, e sim ao colonato, regime de trabalho, principalmente com imigrantes estrangeiros, que se sucedeu ao escravismo. De especial interesse tanto para os defensores como para os críticos das condições de vida vigentes atualmente em Cuba é o volume “Cuba sem bloqueio – A revolução e seu futuro, sem as manipulações da mídia dominante”. São 450 páginas, de autoria de Hideyo Saito, que fez o texto final, e Antonio Gabriel Haddad, em lançamento da Radical Livros. Diz a introdução: “Cuba não é, definitivamente, um paraíso terrestre. Mas quantos países capitalistas constituem uma sociedade razoavelmente harmônica, sem concentração de riqueza, sem miséria, sem fome, sem analfabetismo, sem violência social e sem crianças abandonadas, como a que está retratada nas páginas deste livro?” Agora, façamos um intervalo sobre piadas, mas não é um intervalo ameno. Trata-se de um livro do professor da Universidade Estadual Paulista-Unesp, Dagoberto José Fonseca, “Você conhece aquela? – A piada, o riso e o racismo à brasileira”, publicado pela Selo Negro Edições, sobre as chamadas “piadas de preto”. Além de constatar que as piadas pejorativas sobre os negros continuam amplamente difundidas entre a população, apesar da voga do “politicamente correto”, Fonseca analisa, em geral e em cada caso, como essas piadas “ainda servem de instrumento de preconceito, discriminação e marginalização”. A conclusão: “O discurso da piada e seu riso ridicularizante mostram assim a falácia da democracia racial brasileira”. E atenção: notícias em primeira mão da Amazônia! Estão no livro “A Amazônia em questão – Belo Monte, Vale e outros temas”, do grande jornalista Lúcio Flávio Pinto, publicado pela B4 Editores. Entre outras, o livro responde às seguintes perguntas: “Por que razão a Vale se desfez de uma companhia de navegação – Docenave – quando esta apresentava resultados extraordinários? Por que a hidrelétrica de Belo Monte pode transformar-se num logro colossal? Por que o minério de ferro extraído de Carajás pesa bastante na balança comercial brasileira, mas pouco mudou a vida da população da região?” A ver, urgente. Finalmente, um prêmio, um lançamento de relevante importância para os leitores e para todos nós da “Caros Amigos”: a publicação, pela Dash Editora, de “80 desenhos”, de Guto Lacaz, uma seleção de ilustrações “nonsense” com que esse grande artista plástico embelezou todos os números ao longo de quinze anos de existência da revista. Pode-se dizer que, mais do que “nonsense”, os trabalhos de Guto são manifestações conceituais e existenciais sobre a condição humana – ele sempre “diz” alguma coisa sobre cada um de nós. Guto dedica o livro tão cheio de cores e formas tão bem trabalhadas à memória do psicanalista e escritor Roberto Freire, já falecido, fundador da “Caros Amigos”, ao lado do jornalista Sérgio de Souza, também já falecido, e lembra que Freire foi quem o trouxe para a revista.

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