26 de maio de 2013

Tocqueville, o padrinho da democracia

Resenha encomendada pelo Diário do Comércio de São Paulo: A vida de Tocqueville, o padrinho da democracia - Renato Pompeu - Grandes vidas precisam de grandes biógrafos e isso é justamente o que é “Alexis de Tocqueville – o profeta da democracia”, do historiador, jornalista e empresário de celulares inglês Hugh Brogan, livro lançado no Brasil pela Editora Record seis anos depois de sua edição original na Inglaterra, sob um título que teria sido mais bem traduzido por “Alexis de Tocqueville – profeta da democracia na era da revolução”. Se a vida do mais famoso pensador da democracia de todos os tempos é digna de uma biografia monumental como esta, de mais de 700 páginas, não menos capacitado para escrevê-la é o autor Brogan. Afinal, este é o seu terceiro livro a respeito de Tocqueville, e Brogan passou cinco décadas se documentando e pesquisando a vida de seu biografado. Assim como Tocqueville era filho de um conde do Antigo Regime francês, Brogan é filho de um “sir” inglês e nasceu em 1936. Formado na famosa Universidade de Cambridge, ele começou a trabalhar como jornalista, aos 24 anos de idade, nada mais nada menos do que no mais prestigiado órgão jornalístico do mundo, a revista inglesa “The Economist”. Depois, estudou História mais profundamente nos Estados Unidos, do mesmo modo que Tocqueville foi morar nos EUA aos 25 anos, em 1831. Brogan se tornou professor em Cambridge e na Universidade de Essex, de onde saiu em 1998 para fundar a Sendo, fábrica de celulares que em 2005 vendeu para a Motorola. No ano seguinte, lançou o livro agora publicado no Brasil. Em 1973 Brogan já havia publicado um ensaio sobre seu personagem, intitulado “Tocqueville”. Em 1991, publicou uma coletânea da correspondência de Tocqueville. No intervalo, tinha ficado famoso entre o grande público com a edição de uma monumental história dos Estados Unidos, em 1985 pela Longman e em 1990 pela Penguin. No novo livro, Brogan conta como Tocqueville nasceu em 1805, em Paris, filho de um conde descendente de nobres normandos que ajudaram Guilherme, o Conquistador, a se apoderar da Coroa inglesa em 1066. O conde e sua mulher haviam servido o rei Luís 16 e em 1794 escaparam por pouco da guilhotina, simplesmente porque o líder da Revolução Francesa que os pretendia decapitar, Robespierre, foi ele próprio preso e decapitado. Em seguida, o conde e a condessa se refugiaram na Inglaterra, mas voltaram para a França ainda no tempo de Napoleão. O filho Alexis estudou na cidade de Metz. Com a queda de Napoleão em 1814, o conde assumiu altos postos na monarquia restaurada. Em 1830, aos 24 anos, o jovem Alexis foi eleito deputado pelo Departamento da Mancha, mas, como não gozava da confiança da direita, por ser abolicionista e partidário do livre comércio, nem da esquerda, por ser de origem nobre, pediu ao rei para fazer uma viagem de inspeção a prisões e penitenciárias nos Estados Unidos. Ali chegou em 1831 e ali passou nove meses, dos quais tanto tempo observando e aprovando a punição física pela chibata e, principalmente, pela solitária, aos presos quanto participando de festas e banquetes. De volta, publicou um relatório sobre sua missão, mas, principalmente, lançou em 1835 o seu monumental livro “Sobre a democracia na América”, um clássico sobre as virtudes políticas e econômicas da democracia de livre mercado, que na sua visão não só permitia o máximo de liberdades individuais a que uma sociedade humana pode aspirar, como também garantia um maior bem-estar social a todos os cidadãos. Depois Tocqueville continuou ativo na política até 1851, tendo visitado ainda a Inglaterra e a Argélia recém-colonizada pela França, e ajudou a escrever a Constituição da Segunda República após a revolução de 1848. Quanto à Argélia, foi favorável à segregação entre franceses e árabes; na Constituinte, defendeu o sufrágio universal, mas não por radicalismo democrático e sim por considerar que o voto da maioria nacional de pequenos camponeses conservadores contrabalançaria e superaria o voto socialista das maiorias urbanas. Decepcionado com o fim da Segunda República e com a instauração do Segundo Império, Tocqueville abandonou a política depois de 1851, dedicando-se a fazer um balanço crítico do Antigo Regime, vindo a falecer em 1859. Se essa é a vida pública de Tocqueville, igualmente interessantes, ou talvez ainda mais interessantes, são os aspectos privados de sua vida tal como são descritos por Brogan. Um desses aspectos é que, apesar de Tocqueville ter passado à história como ferrenho defensor da democracia, durante toda a sua vida ele sofreu a nostalgia da nobreza perdida por sua família. Uma perda que foi traumática: além de seus pais terem sido ameaçados de execução, seis membros da família foram efetivamente guilhotinados durante o chamado Terror. Ao mesmo tampo, Tocqueville sentia necessidade de escapar das origens nobres, tanto que se casou com uma plebeia inglesa nada próspera, a quem dedicou cartas apaixonadas. Sofreu também várias crises de saúde, particularmente da tuberculose que o matou aos 53 anos.

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