9 de abril de 2013

Introdução de Juca Kfouri ao romance A saída do primeiro tempo, de Renato Pompeu, de 1978

Introdução Juca Kfouri A “Saída do Primeiro Tempo” é um clássico da literatura futebolística nacional. Pena que, de tão vanguardista, tenha sido lançado ainda em 1978, razão pela qual, apesar de atualíssimo, o livro seja muito menos conhecido, e badalado, do que merece e precisa ser. Precursor de obras como as de José Miguel Wisnik (“Veneno Remédio”) e Hilário Franco Júnior (“A Dança dos Deuses”), Renato Pompeu nos conta uma literalmente fantástica história da Ponte Preta, dessas que torcedor algum pode desconhecer. E, se não bastasse, no intervalo entre o primeiro e o segundo tempos da saga do espectro da velha Macaca, Pompeu traça uma genial, criativa, obrigatória, Teoria do Futebol, tomando de empréstimo o primeiro capítulo de “O Capital” de Karl Marx, sobre a Mercadoria e seus fetiches. Ninguém passa impune sobre as 74 páginas do ensaio, “O Futebol, Crítica da Economia Política”. Ninguém. Nem que não goste, até odeie ou despreze o futebol. E ninguém que leia seguirá vendo futebol do mesmo jeito. Em ótima hora, porque o Século 21, a Ponte Preta e as torcidas do Corinthians e do Flamengo merecem, para não falar das demais, é claro, a obra de Pompeu é relançada, para compor uma espécie de trilogia com Wisnik e Franco, compondo um triângulo que vai muito além das bermudas, porque das chuteiras, calções e camisas que produzem esse encantamento chamado jogo de futebol, com todos os seus segredos, seus mistérios mesmo, que quanto mais revelam mais escondem, num jogo mágico de labirintos sem fim. Porque, como Pompeu explica sabiamente, as ciências sociais têm se preocupado mais com coisas chatas do que com as lindas e maravilhosas como o Futebol, que carrega em si a tendência de ser Atividade Única do mesmo modo que se sonha com a Religião Única ou com o Partido Único. Ora, quem já pensou que o futebol implica na existência da Mulher, pois senão os jogadores não teriam nascido? Pompeu pensou. Quem já refletiu sobre a complexidade da Saída do Primeiro Tempo? Pompeu refletiu. E sobre a vocação democrática implícita do futebol? Além do Doutor Sócrates, só Pompeu ponderou, e antes do Magrão. O homem brinca com a bola que é redonda como o mundo é redondo e realiza pelo futebol o desejo de todos, o de brincar com o mundo. Pompeu brinca com as palavras, com as ideias, as teorias, e nos diverte e instiga ao tratar o óbvio com a inteligência que só os mais bem providos são capazes. Tanto que elege João Saldanha como o maior intelectual brasileiro e ensina que o gol é a vitória da Vida sobre a Morte, o triunfo do dinamismo contra o imobilismo, já que os jogadores e a bola são móveis, e, as traves, imóveis. Não, não contarei mais. Chega de estragar prazeres. Pena que o velho alemão não poderá desfrutá-los como você.

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